Geraldo Alckmin e a roupa nova do imperador



O interesse da mídia pelas escolas de luta diminuiu. Claro. Ela só acordou depois que foi impossível negar a importância da resistência dos alunos à tal "reorganização" do governador Geraldo Alckmin. Foi quando um furo de reportagem da jornalista Laura Capriglione divulgou o áudio de uma reunião secreta do chefe de gabinete da Secretaria da Educação, Fernando Padula, em que ele declarou guerra aos alunos das escolas ocupadas.

Essa reunião na SEE ocorreu no dia 29 de novembro e a revelação dessa estratégia de guerra, bem como algumas corajosas manifestações de rua dos alunos, não puderam ser ignoradas pela grande mídia, mesmo com muitas manipulações. Depois disso, porém, a conversinha mole do “picolé de chuchu”, através dos diretores de escola, foi convencendo os pobres pais de alunos de que seus filhos estavam sendo prejudicados em final de ano letivo, que estavam perdendo as provas finais, a formatura e bla bla bla... Com isso, algumas escolas acabaram sendo desocupadas pelos alunos e o assunto na mídia foi ficando cada vez mais morno. Até o Leo Sakamoto nos abandonou... rs

O que a sociedade não sabe, é como se dá esse tipo de “desocupação”. É o que vou tentar mostrar hoje. Eu havia reservado o domingo para visitar duas escolas que estavam em risco de serem desocupadas: a EE Salvador Allende, na zona leste e a EE Plínio Negrão, na zona sul. Essas duas escolas se destacaram dentro das escolas de luta, pelo grande protagonismo de seus alunos.

Pois é, durante a madrugada do domingo fiquei sabendo que a Salvador Allende foi desocupada, então fui para a Plínio Negrão e tive uma conversa reveladora com os alunos da ocupação, que já conhecia e que haviam me impressionado com sua clareza de pensamento e objetivos.

Antes, porém, cabe fazer uma comparação interessante das duas escolas, aparentemente muito diferentes, mas com vários pontos em comum. A Salvador Allende está localizada na periferia da zona leste, numa região muito diferente da Plínio Negrão, que se encontra a dois passos da Granja Julieta, zona residencial da elite de Santo Amaro. 

No entanto, se a Salvador Allende atende os alunos da periferia da zona leste, os alunos da Plínio Negrão vêm da periferia da zona sul, ou seja, dos bairros além da ponte da João Dias, numa linha que vai até ao Capão Redondo...

A primeira pergunta que cabe aqui é: por que alunos de bairros periféricos “preferem” chacoalhar no transporte público para estudar numa escola central? Pode haver vários motivos: tiveram negação de vaga na escola próxima de casa, ou os pais trabalham numa região central e podem levá-los ou buscá-los, ou ainda pensam que uma escola central é melhor. Este é um assunto muito sério que merece um post a parte...

No caso específico da Plínio Negrão, os alunos que ocupam a escola também não moram nas proximidades, e durante esse período têm recebido constantes ameaças dos moradores das redondezas, que não querem “mais nenhum favelado” estudando no bairro. Não há ninguém protegendo os três portões do colégio, que ocupa praticamente um quarteirão, pois as famílias desses alunos moram muito longe e não têm condições de passar a noite ou até a madrugada na porta da escola. Fiz questão de ficar conversando com os alunos no portão, não entrei no prédio justamente para perceber o “movimento” da rua. Durante quase uma hora, sendo uma tarde ensolarada de domingo, não passou NENHUM pedestre em frente à escola, pouquíssimos carros, alguns micro-ônibus e, muito estranho, uma perua branca sem identificação passou 4 vezes por lá... Foi um dos alunos que reparou nisso, eles ficam muito atentos ao que ocorre ao redor da escola. Por que será?

Pelo mesmo motivo que provocou a desocupação da Salvador Allende. Ambas escolas sofreram invasões na calada da noite. Na Salvador Allende isso ocorreu diversas vezes e de forma muito grave: indivíduos não identificados não apenas vandalizaram o prédio, mas roubaram objetos dos próprios alunos e da escola. A última invasão ocorreu esta sexta-feira e  fez com que os alunos temessem não apenas pela própria integridade física, mas por virem a ser responsabilizados pelo vandalismo e pelo roubo de qualquer coisa que tenha sido levada da escola. Só quem conhece a rede pública por dentro sabe o inferno que viram os famosos processos administrativos, que acabam com a paz das escolas e chegam a durar cinco anos, ou seja, as convocações para as audiências podem ocorrer até anos depois que os alunos tiverem saído de lá!

Os alunos da Salvador Allende deixaram um documento na página da ocupação no Facebook, explicando por que desocuparam o colégio, e postaram muitas fotos e vídeos que mostram o tanto que cuidaram do prédio, as muitas atividades culturais que desenvolveram e as aulas que receberam de voluntários e simpatizantes das escolas de luta. Todo esse material vai servir para comprovar que não foram eles a vandalizar a escola, e a hora de sair chegou justamente no momento em que esses indivíduos “não identificados” já tinham tentado prejudicá-los de todas as formas. Agora só faltava provocar acidentes que colocassem em risco sua integridade ou até que destruíssem a escola. Nada complicado atirar uma bomba ou provocar um incêndio dentro da escola, para depois responsabilizar os alunos...


A segunda pergunta que cabe aqui é por que, então, os alunos da Plínio Negrão não desistiram, enquanto os da Salvador Allende já desocuparam a escola?

Em primeiro lugar, fica bem claro pelo depoimento dos alunos da Salvador Allende que eles não desistiram, nem deram o braço a torcer. Eles saíram da escola na melhor hora e deixaram depoimentos e documentos que demonstram como a ocupação foi positiva. 

Quanto aos da Plínio Negrão, eles estão resistindo, mas com medo e com razão: durante a invasão da madrugada passada, chefiada pela direção da escola, por policiais e por alunos contrários a ocupação, todas as correntes e cadeados foram quebrados. Os ocupantes lançaram um apelo para que seja feita uma nova doação desses materiais, a fim de dificultar uma nova invasão na calada da noite, pois não há ninguém para proteger a escola do lado de fora. Durante a invasão, vidros foram quebrados e objetos danificados, além de os alunos terem recebido diversas ameaças. Uma delas, aliás, foi repetida por um dos invasores, que no facebook se identifica como Matheus Marcos e diz: "O povo da ocupação me bloqueou, saibam de uma coisa, isso de ontem foi só uma prévia!".

Essas invasões e ataques, que têm ocorrido em todas as escolas de luta,  são o verdadeiro motivo que provocou a desocupação das escolas. Pois os alunos não são bobos e não caíram na conversa do "picolé de chuchu"... Aliás, a minha orientação é a seguinte: antes de desocuparem a escola, verifiquem se todos os alunos terão sua rematrícula confirmada e se as inscrições abertas foram para os mesmos ciclos. Ou seja, se este ano a escola recebeu alunos do Fundamental II e do Ensino Médio, tudo deve continuar como está.

Talvez, a única falha dos alunos de algumas escolas de luta tenha sido soltar o bordão "o Geraldo vai cair". Pois é, até eu adoraria que o Geraldo caísse, mas sei que não é simples, pois a maioria da população paulista reelegeu essa figura... e o que vamos fazer?...

Os jovens não são politicamente corretos - e é bom que não sejam, senão vão-se as esperanças e os sonhos. Quem sabe, algum deles consegue mostrar o Geraldo "nu", como na história da roupa nova do imperador?... rs

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