A escola tabu nº 33 - O "bom" exemplo


De alguns anos para cá, constatamos que a qualidade do ensino não é mais o maior problema da educação brasileira. Algo muito pior tem vindo mascarar a incompetência da escola e não se trata apenas de uma cortina de fumaça, é algo como um tapete em brasas.

Que a rede pública brasileira é autoritária, isso já vem da ditadura militar, mas, curiosamente, desde que se fala em avaliar a qualidade das escolas, esse autoritarismo tem aumentado sobremaneira. O aluno da rede pública, principalmente o adolescente e o do curso noturno, tem sido tratado como criminoso em potencial. Por qualquer motivo chama-se a polícia na escola, que aliás já costuma estar a postos. E dá-lhe suspensão, suspensão coletiva e expulsão por motivo fútil. O aluno não tem direito a defesa, a não ser diante de "tribunais" de exceção formados pelos Conselhos de Escola, onde brinca-se de promotor, advogado e juri.

O que o Conselho decide, está decidido! Trata-se de um jogo de cartas marcadas que resulta num fenômeno (mais um!) que os sociólogos brasileiros ainda não se dignaram a estudar: a "transferência compulsória". Essa transferência é, na verdade, expulsão pura e simples, pois todos os alunos vítimas dessa manobra são muito claros: receberam a tal "transferência" para... lugar algum. A escola simplesmente os coloca na rua e manda que "se virem" para encontrar vaga em qualquer outro lugar. É óbvio que aluno da rede publica não anda de mercedes com motorista e precisa estudar no mesmo bairro onde mora. Mas o fenômeno da "transferência" compulsória reserva mais uma surpresa: a "ficha" do aluno é amplamente divulgada para todas as escolas da região, através de profissionais da "educação" que fazem a caveira do aluno para seus colegas que dão aula no mesmo bairro. Assim, a criança ou adolescente "transferidos"... para lugar algum acabam não encontrando vaga em nenhuma outra escola, já que chegam em todas com a pecha de arruaceiros, bagunceiros, laranjas podres etc. etc.

A voz do aluno nunca é ouvida, a não ser por nós, pais de ex-alunos que sabem de que forma foram tratados os próprios filhos. Dificilmente, a criança e o adolescente faltam de respeito a um professor ou outro profissional da escola sem serem provocados. Já nossa antiga Cartilha sobre os Direitos do Aluno continha diversas expressões que alunos e pais haviam ouvido da boca de supostos "educadores". Nos últimos meses, o leque de xingamentos ouvidos pelos alunos que nos procuram foi ampliado por diversos impropérios, por exemplo

Estrupício

A xingação mais "criativa" foi feita recentemente por uma professora que disse à classe:

Esse ambiente parece mais uma fazenda, cheio de vacas e galinhas que precisam de uma linguiça para ficarem felizes.

Uma das alunas respondeu que não era uma fazenda com os tais animais, pois a filha dela não estudava ali.

A aluna foi suspensa e está em vias de receber a tal "transferência" para lugar algum. Ela pediu desculpas, mas não adiantou. A diretora disse que "na escola dela" não admite aluno desrespeitar professor. Mas ela admite o mau exemplo de supostos "educadores"! É uma tremenda inversão de valores, onde exige-se do ser em formação mais responsabilidade do que do marmanjo...

Essa é a rede pública brasileira, onde se provoca o aluno até ele revidar ou evadir. Trata-se de um dos motivos pelos quais 50% dos alunos do Ensino Médio não completam o curso...

Mas essa é uma outra história que fica para uma outra vez. O Ensino Médio público brasileiro compara-se, ele próprio, a uma transferência para lugar algum. Pobre aluno!!! Há uma década, criminosos do MEC acabaram com o curso técnico integrado ao ensino médio, justo quando em São Paulo, por exemplo, criminosos da SEE fecharam mais de 300 escolas, que poderiam ser, hoje, celeiros para oferecer bons técnicos ao mercado de trabalho. Muito triste!!! Ainda vamos contar direitinho essa história que nos indignou profundamente e nos levou às ruas, infelizmente em vão.

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